Fluxo de consciência
O metrô. Nunca mais pegou o metrô aquela hora da tarde. Péssimas lembranças de ser esmagada contra as portas de vidro e quase não conseguir saltar na sua estação. Mas não havia jeito, era isso ou pegar um trânsito desgraçado até o estágio para o qual já estava horas atrasada.
Duas vezes entrara sem prestar atenção no vagão das mulheres. Detestava-o. Ainda mais àquela hora da tarde. Parecia que mil mulheres falavam todas juntas sobre assuntos diferentes. Um uníssono insuportável, sentia a cabeça doer cada vez mais. Nessa hora, sentia-se tudo, menos mulher. Olhava- as estranhando-as como se não fosse também uma do mesmo gênero, escandalosa, histriônica, falante.
A diferença toda é que estava sozinha consigo e seus pensamentos, o que é deveras insuportável num vagão de metrô cheio de gente.
Estácio, hora da baldiação. Pessoas andando como robôs-formigas, apressadas, como se suas vidas dependessem daquele trem que deveria estar chegando. Havia uma escada em algum lugar e ela não conseguia visualizar os degrais. Escada! Calma, não vejo. Estava longe do corrimão. Fez algum esforço para ver somente o que tinha debaixo de seus pés, para que não caísse, não saísse rolando.
Pensou: eu devo ser a pessoa aqui com mais auto – consciência. Já era o fluxo de pensamentos falando. O fluxo, sempre pendendo para o negativo, para o inegável trágico da existência. Melhor esperar que dê errado mesmo, menor o tombo.
O problema é que existe uma fagulhinha de coisas boas no meio disso tudo, ela sabia bem: esperança. De achar que as pessoas são nem que seja um pouquinho como ela. Não eram. Mas essa puta dessa esperança se agarra a qualquer coisa para não ser abandonada, não é mesmo?
Consciência grita silenciosamente na cabeça dela: Pára de pensar nas coisas boas. Se concentre ou pare de pensar. Aliás, vá trabalhar, menina.
Fora um de seus dias mais produtivos no trabalho.
Eu sempre achei o tempo gasto dentro dos coletivos pensativos demais, é difícil parar de pensar mesmo com um livro pra ler ou com os fones no ouvido; chegar no trabalho acaba virando uma fuga de si mesmo.
bruno said this on março 11, 2009 às 1:56 am
Eu acho a esperança muito perversa. Tem algo de cruel em ter esperança. Cruel consigo mesmo.
Gostei dessa inversão: “Mas essa puta dessa esperança se agarra a qualquer coisa para não ser abandonada, não é mesmo?”
A esperança se agarrando. Porque acontece mais da gente se agarrar nela, pelos nosso intentos de ver coisas acontecerem ao nosso modo. Mas ainda haveria redenção se a sua inversão for o que se dá realmente. Culpa da esperança que se agarra a qualquer coisa – até em nós – para não ser abandonada (já que nós, uma hora ou outra, acabamos por abadoná-la sim).
Bruna said this on março 12, 2009 às 7:38 pm