Madrugada

Três horas da manhã. Ela havia esquecido da facilidade de dar um telefone fosse a hora que fosse da madrugada e ter ali, à disposição o que quisesse ou desejasse num momento. Amigo, amante, companheiro… Três horas da manhã, entrara, de madrugada, pela primeira vez em dois anos numa vida e prédio que abandonara, numa intimidade que nunca antes tivera com o porteiro da madrugada anunciando: Sr. Luis Augusto, vou pro apartamento 703 mas não precisa tocar o interfone. Sendo ela já conhecida mesmo quando morava lá por este tipo de incursão noturna, não havia surpresa a se esperar.
Ao caminho, ela ainda em lágrimas, tentando resolver por telefone algo que não seria resolvido, e recebendo ao mesmo tempo ligações dele, perguntando onde estava – ansiedade? – subia um caminho cujo número havia esquecido mas nunca deixara de ser familiar.
Ao descer do elevador, ele já a esperava na porta, que abriu para ela e a trouxe para dentro daquele furação incompreensível e misterioso que sempre fora aquela casa virada para o cemitério.
Ele havia mudado a disposição dos móveis do quarto, mas ainda havia desenhos animados na tv e jogos no computador. Ele a ouviu, pacientemente após o comentário: meu amor, você está mal mesmo!
E a ouviu, como sempre fazia. E deus suas opiniões da maneira mais delicada e ao mesmo tempo firme e ao mesmo tempo falando o que devia falar, as verdades todas, sem medo. E sem medo de também dizer: eu te escolhi e para mim,você vai sempre sair ganhando e de muito!
Pela primeira vez em dois anos, ela deitou no colo dele contente. Sem pensar em nada, nem no papo de relacionamentos passados cujo conselho fora: coloca num saco. Abre depois, se valer a pena, quando for a hora, ou não.
Mas ele a beijou, como sempre ele a beijara e murmurava uma saudade que era tangível em cada toque, em cada olhar. Após tirar saia, colete, tênis e camisa, deu-se com um espartilho combinando com a calcinha, cinta-liga e meias com rendas. A exclamação de : você está linda, não teria sido tão perfeito se houvesse sido combinado, repetida várias e várias vezes. Assim como as palavras que eram só deles e o re-acostumar-se. E a urgência e a paciência que devia-se ter.
Desde os três anos que estiveram juntos, pela primeira vez, ela murmurara o nome dele e ele o dela. Era saudade. Nunca souberam se houve amor. Se houve, sempre passou dispercebido por momentos extremamente felizes, muitas vezes entediantes e com pouco, bem pouco sofrimento.
O que incomodava era o tipo de relacionamento, ideal para ela aos 18 anos, mas crescer segurando-se para de fato não se apaixonar nunca foi um ideal.
Há amores e amores. Talvez aquilo tenha sido uma espécie de um, mas ela nunca soube dizer, tão tranquilo era. Acostumada que está à tempestades, nunca soube o que era e nunca tentara decifrar. Só lembrava e sabia que havia sido feliz mesmo sem querer. Ao ponto de murmurar um nome que não é O amor.

~ por M. em dezembro 25, 2008.

2 Respostas to “Madrugada”

  1. é, axo que foi por isso que eu recuperei o meu blog!
    Essa ansia de voltar a ter as coisas boas que eu tive!
    e mante-las =D

    Te adoro muléé

    é e estamos nomesmo barco!
    hehehe
    beijus frô

  2. Mayra, que lindo! O que eu posso dizer, diante do que está escrito?
    Eu acredito tanto nesse “Há amores e amores”; como o do texto que, para muitos, pode não passar nem perto de uma idéia de amor, por fugir ao que de convencional acreditam ser esse sentimento. Enfim, é tão bonito, gostei tanto, que não quero ficar aqui falando coisinhas. Muito bonito, isso é o que posso dizer.

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